MEU PAI E MEU RÁDIO

20-08-2011 19:01

Meu Pai e meu radio.

Um dia quando chegava do colégio por volta da hora do almoço, tinha meus 10 anos de idade e cursava a 4º série primária (e se vai tempo pois, o nome hoje em dia e primeiro segmento), quando entro na sala de minha casa vejo meu pai com um aparelho na mão, ate ai nada demais pois era uma cena muito comum para todo bom taxista, na época era normal levar na mão o radio "toca-fita Roadstar" na " bandeja", mais aquele aparelho era diferente, aquele aparelho tinha um microfone pendurado, curioso como sempre fui perguntei ao meu pai o que era aquilo.

Com toda a paciência que lhe era peculiar disse:

- Sai daí garoto, esse o rádio que comprei para colocar no corcel, é para falar com meus amigos e com sua mãe e não quero ver você mexendo nele.

Na verdade ele já sabia que eu iria mexer, já sabia que aquele radinho seria uma "droga" benéfica para a família, na época não existia aparelhos celulares ou outros meios de comunicação portáteis e o PX era um dos meios que ele tinha arrumado para ficar em contato com a família, estar um pouco mais próximo afinal a cada dia ele tinha que trabalhar mais para sustentar com seu taxi Ford Corcel eu e meus três irmãos e minha guerreira mãe, seria um alento de presença, e um de nós tinha que assumir essa função de deixar o radio funcionando em casa.

Instalou no seu carro Ford Corcel GT preto e branco, um novíssimo Motorádio F-AM-21, uma antena "Maria-mole", e para casa levou um radinho um pouco melhor, um CRAIG SSB 600 e como tinha Banda lateral tinha um alcance maior, mais ai seu plano inicial começou a cair por terra...

Com tudo instalado e funcionando, com a ajuda dos amigos do PX Clube de Petrópolis, tomei o radio de assalto pois minha mãe não gostou muito e meus irmãos , mais velhos estavam na adolescência preocupados com outras diversões,e minha irmã mais nova ainda era muito novinha, assim me coube esta dura responsabilidade de manter o radio ligado e na escuta para falar com meu pai.

Assim, apaixonado pelo meu novo brinquedinho, corria do colégio direto para casa para falar com meu pai via rádio px, meus amigos queriam jogar bola, jogar Atari, soltar pipa , aquele aparelhinho me fascinava mais que qualquer brincadeira, pois diminuía a distância que tinha do meu pai, me deixava junto dele no trabalho e a hora que eu quisesse.

Mais tinha algo mais, além de suprir minha carência, um pouco da ausência que tinha do meu pai devido a seu extenuante trabalho, algo mais me fascinava, pois mesmo nos momentos que ele não estava eu estava perto do rádio, e fui aprendendo, mexendo aqui e ali, trocando as antenas conforme as dicas que recebia via rádio dos colegas que vinha fazendo, muitos emocionados em estar falando com um pequeno menino de 10 aninhos e tão interessado pelo rádio.

Como disse acima, meu pai teve seus planos modificados quando instalou o Craig SSB 600, pois descobri que tinha uma tal de propagação que abria todo dia na parte da tarde e deixava eu falar com pessoas distantes, fazer contatos com pessoas no nordeste, Norte e até em outros países!! Que fantástico, e assim na parte da tarde o canal 7 a onde eu ficava trocando pequenas idéias com meu pai, ou mesmo somente vendo se ele estava por lá e se estava tudo bem foi ficando de lado, a tarde aos poucos meu pai foi vendo que não mais estaria lá "sempre", e assim com sua experiência e sabedoria combinou comigo que aparecesse pelo menos nas horas cheias para passar alguma coisa.

Comecei a fazer meus DX´s e a cartões começaram a chegar, com isso a empolgação a crescer e a crescer, a ponto de não dar mais tempo de aparecer nas horas cheias, eram chilenos, argentinos, espanhóis, italianos, portugueses que fantástico, mais meu pai esta me esperando para falar com ele que dilema, saia para ir no canal 7, e falava com ele sobre os contatos com o exterior, e ele falava então vai lá garoto vai...

E assim seu plano de ter um meio de comunicação estável já era, mais a minha alegria era tamanha com o rádio e tudo que o envolvia, que ele simplesmente acabou com a idéia usá-lo como contato e passou a me acompanhar em minha jornada de Dx´s de papos técnicos, entrou para o PX clube de Petrópolis e junto com ele fui também a minha tarde, já com 11 anos, eram passada as segundas, quartas e sexta- feiras no plantão do Px clube de Petrópolis em rádio e na sede, meu pai para não perder o contato, se empenhava em aprender um pouco mais sobre rádio, mais infelizmente com sua 4º primaria somente não dava para acompanhar aquela avalanche de informações, mais ainda se esforçava e me dava todo apoio, comprava o que ele podia para melhorar a estação, nada demais pois o dinheiro era curto até para a alimentação, mais ele sabia que isso era o meu sonho e assim provia o que podia.

Hoje no dia dos pais, com meus 43 anos de vida e com a minha filha e meu pai longe, me lembro desses momentos com os olhos marejados, sei muito bem do valor que estes momentos tiveram no meu desenvolvimento, e principalmente o reflexo que isso teve em minha vida como um todo, naqueles exemplos de carinho, dedicação e doação pelo sonho do filho, abdicando de seus planos por mim, e como pai, mesmo sem a visão de conhecimento devido a sua humildade, de alguma maneira ele sabia que aquela "caixinha preta" iria me dar grandes oportunidades e abriria muito meus horizontes.

Sei que nunca lhe disse isso meu PAI mais muito obrigado Pai por tudo.

Fábio Hoelz (Py1ZV)